Artigo - Dia do artista

08/09/2011 15:17

Por : linguanet

Como dia 24 de agosto foi o dia do artista, quero falar sobre um poema, do maior poeta brasileito vivo - Ferreira Gullar. No poema Traduzir-se, o eu-lírico artista se confronta; leiam a análise que escrevi desse lindo poema:

 

O "sujeito-lírico" do poema "Traduzir-se", de Ferreira Gullar, considerando a concepção de poesia do poeta.

Por: Silmara Nunes

 

            Para Ferreira Gullar a poesia não é objeto, pelo contrário tudo que tem vida é poesia. Sua intenção ao escrever é ajudar os leitores de alguma forma, seja com uma possível identificação ou chamando a atenção para um novo olhar. Preocupa-se muito com as questões sociais e com a ética.
            Por que o poeta em "Traduzir-se" faz o uso de tantas antíteses? Nota-se que, esse recurso reitera o questionamento, o desenvolvimento da ideia de conflito do "eu" com ele mesmo. O eu – lírico sente-se muitas vezes só, mesmo em meio a uma multidão. O eu – lírico hesita entre dois pensamentos no qual “uma parte”, voltada para a vida social, e “outra parte”, o outro lado, escondido, no seu próprio mundo, um eu – egoísta. 
            Observa-se que neste poema, Ferreira Gullar faz um questionamento sobre o que é arte. Uma parte do poema refere-se à pessoa comum e a outra parte ao eu – lírico do artista, o homem comum “pensa e pondera”, o artista “delira”; o homem comum “Almoça e janta”, já o eu – lírico do artista se espanta, no sentido de que a poesia tem esse poder, de espantar a sociedade. O homem comum é “permanente”, no sentido de mesmice, monotonia, ao passo que o eu – lírico artista “se sabe de repente”, a arte nasce quando não se espera e é mutável. Todos os versos possuem essa dualidade e apontam tanto para o eu – lírico comum, quanto para o eu – lírico do artista.
            Um dos desafios da existência é tentar compreender o seu significado. Em cada época, a literatura produzida traz consigo questionamentos acerca da instabilidade da vida, do desacerto com o mundo e da busca de respostas para o "eu" e suas contradições. Ferreira Gullar faz isso muito bem não só neste poema, mas em muitos outros. 
            Eis o bela poema:

Traduzir-se
Uma parte de mim
é todo mundo:
outra parte é ninguém:
fundo sem fundo.

Uma parte de mim
é multidão:
outra parte estranheza
e solidão.

Uma parte de mim
pesa, pondera:
outra parte
delira.

Uma parte de mim
almoça e janta:
outra parte
se espanta.

Uma parte de mim
é permanente:
outra parte
se sabe de repente.

Uma parte de mim
é só vertigem:
outra parte,
linguagem.

Traduzir uma parte
na outra parte
— que é uma questão
de vida ou morte —
será arte?